O mercado editorial tradicional já morreu

Antes de abrirmos o Clube de Autores, o CEO de uma das maiores redes de livrarias brasileiras veio até nós e nos aconselhou fortemente a “não seguir adiante com uma ideia que certamente não conseguiria se sustentar nem por um punhado de meses uma vez que o mercado é de quem tem tradição e habilidade em lidar com as complexidades de um país como o nosso”. 8 anos se passaram e estamos aqui, de pé, crescendo e com uma base de mais de 50 mil autores, enquanto a tal rede de livrarias – embora ainda uma gigante perto de nós – enfrenta dificuldades financeiras potencialmente fatais.

Não digo isso para tripudiar deles ou para me vangloriar do Clube – não são os egos que estão em jogo aqui. O que está em jogo é o futuro dos livros.

Por que? Porque, até então, o futuro dos livros estava nas mãos desses grandes livreiros e editores que, de uma forma ou de outra, nos trouxeram até aqui. Foram esses livreiros e editores que entregaram ao grande público brasileiro não apenas os Dostoiévskis, os Prousts e os Tolstois como também os Graciliano Ramos, os Guimarães Rosas, as Cora Coralinas. Foram estes então destemidos aventureiros que nadaram pelas letras do nosso país e pescaram preciosidades que para sempre mudaram as nossas próprias feições culturais.

Mas eles envelheceram, tornaram-se decrépitos ranzinzas incapazes de entender as mudanças pelas quais o mundo já passou. Cansados, eles pararam de assumir os riscos necessários de garimpar novos talentos e entregaram-se ao inferior trabalho de vender apenas os estrangeiros já testados e comprovados em outras terras. Teimosos, eles transformaram essa terra maravilhosa em um mercado puramente consumidor (e não produtor) de literatura.

O resultado desse pensamento retrógrado, de um senso de inferioridade constrangedor? Esses próprios editores e livreiros brasileiros estão conseguindo quebrar o nosso mercado editorial no mesmo momento em que a avidez pelo livro passou a crescer exponencialmente. Nunca se leu tanto no Brasil como agora – mas nunca uma crise tão avassaladora se abateu sobre o mercado editorial brasileiro. Para ficar em dois números simples, divulgados recentemente pela SNEL: o faturamento do mercado de livros caiu 3,09% em 2016 em relação a 2015; em volume de vendas, a queda foi ainda maior: 10,84%. Só há más notícias no mundo dos velhos editores e livreiros. Só há pesadelos.

Sim, algo está errado – não é a primeira vez que escrevo sobre isso aqui no Clube. Aliás, já peço desculpas por estar cansando os autores com essa insistência em requentar o mesmo assunto – mas é que o assunto é importante.

O assunto é uma mensagem.

Você, autor, que sonha em ser descoberto por alguma grande editora e viver como um Hemingway dos trópicos, desista desse sonho. Hemingway nasceu em outros tempos, em outros lugares – e, é sempre bom relembrar, acabou com a própria vida.

O tempo de Hemingway não existe mais: editoras não descobrem mais ninguém, nem lá fora e muito menos aqui dentro. Editoras não fazem nem ideia de como trafegar por essa nossa nova realidade.

Sabe quem consegue garimpar mercado hoje?

O próprio autor.

Você.

Nosso tempo é o tempo de quem sabe (ou tem vontade de aprender a) cuidar da sua obra e lutar pelo seu público.

Nosso tempo é o tempo de quem está disposto a se alforriar desses sonhos sem base de um mundo que já não existe mais para batalhar pelo seu próprio espaço.

Aproveitemos melhor essa revolução.

Grumpy-old-man

Ricardo Almeida

Sou fundador e CEO do Clube de Autores, maior plataforma de autopublicação do Brasil e que hoje responde por 27% de todos os livros anualmente publicados no país. Premiado como empreendedor mais inovador do mundo no segmento de publishing pela London Book Fair de 2014, sou também escritor, triatleta e, acima de tudo, pai de família :)

8 comentários em “O mercado editorial tradicional já morreu

  1. Concordo com essa visão.
    Realmente, os tempos mudaram ( e muito)
    Hoje, as pessoas possuem uma liberdade de escolha impressionante,
    e dificilmente se sentem “presas” à um só tipo de suporte (seja ela impressa ou digital)
    tendo a oportunidade de escolher por conta própria qual o meio de apreciar uma obra
    ou até mesmo publicá-la.

    Parabéns pelo trabalho de vocês.

  2. Muito boa a matéria!
    Até hoje as pessoas me perguntam, por que eu não mando meu livro para as editoras, e semore eu tento arrumar uma resposta porque é difícil explicar a realidade desse mercado para as pessoas.

    Eu acho que vocês deveriam colocar um botão de curtir em cada matéria, assim vocês podem obter um feedback melhor, pois muitas pessoas lêem, gostam, mas não comentam.
    É apenas uma sugestão para ajudar o ótimo trabalho de vocês recebendo o reconhecimento por ele! =D

  3. Antes de decidir publicar minha obra (Zé Calabros na Terra dos Cornos) pelo Clube de Autores, resolvi procurar editoras.

    – A maioria não aceitava originais. Uma grande editora chegou a deixar claro em seu site: “Não aceitamos originais – originais enviados serão destruídos”.
    – Das que aceitavam originais, nenhuma me retornou.
    – De resto, havia outras que fariam o serviço – edição, capa, impressão, etc. – desde que eu comprasse boa parte da tiragem. O que não é tão ruim, desde que você tenha dinheiro e certeza de retorno.

    O Clube de Autores me forneceu os meios de publicar um livro, o que é um passo enorme, o primeiro degrau dessa longa e alta escada.

    1. Tiago, não consigo nem imaginar o futuro de uma editora que deixe claro no site que destruirá os originais que receber. Sinal maior do fim dessa era não pode haver!!

      Que bom que estamos nos reinventando e nos renovando!!!

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