Acordei na terça-feira com a TV alardeando que, na melhor das hipóteses, o Brasil terá 2 anos de recessão. Serão dois anos de uma crise que se intensificará, com mais escândalos que provavelmente se amontoarão na mesa do Sérgio Moro e mais disputas palacianas entre os líderes que, gostemos ou não, foram todos eleitos pelo sagrado voto popular.
Demissões provavelmente continuarão pipocando por todos os lados, juros e inflação permanecerão – pelo menos por mais um bom tempo – travando o crescimento e uma insatisfação nítida continuará pairando sobre o país (muito embora o governo insista em “comemorar” o fato de que as manifestações do dia 16 terem sido menores que as anteriores, ao invés de lamentar o fato delas terem existido).
Mas não me cabe aqui falar de política. Somos um blog de autores, de pessoas devotadas a escrever histórias melhores do que as que tem sido escritas para o nosso país. O que me leva a fazer este post, no entanto, é a sensação de que sairemos desta crise possivelmente piores do que entramos.
Sairemos, provavelmente, com a mesma incapacidade explícita de entender argumentos. Nas redes e nas ruas, o que mais se vê é argumento supérfluo, reduzindo toda a democracia brasileira a uma versão pseudo-politizada do Festival de Parintins, com bois azuis brigando contra bois vermelhos. Se se critica a Presidente Dilma para um petista, ouve-se deste que Alckmin foi incapaz de lidar com a crise hídrica; se se critica denúncias contra Aécio Neves para um tucano, ouve-se que todos os males da humanidade, provavelmente desde Sodoma e Gomorra, foram culpa do PT. Mas poucos param para pensar que a incompetência de um governo jamais, em nenhuma hipótese, poderia ser justificada pela incompetência de outro.
Sairemos desesperançosos. Nas trocas de partidos e no excesso de barbeiragens governamentais, sobraram órfãos de ideologias tidas como sagradas desde a luta pela redemocratização. Pessoalmente, não acho isso triste: ideologias dogmáticas, daquelas que não toleram argumentos opostos e buscam cegar-se diante dos mais claros fatos, precisam mesmo ser destroçadas para que alguma razão seja construída em seu lugar. Mas, mesmo ignorando os velhos dogmas, não há como fechar os olhos para a baixíssima confiança que restará quanto à capacidade das nossas instituições – do Planalto ao Congresso – fazerem o que foram eleitos para fazer.
Sairemos divididos, em grande parte pelo tenebroso discurso de “nós contra eles”, do “pobres contra ricos”, do “sul contra o norte”, alardeado raivosamente na campanha.
Sairemos, muito provavelmente, mais pobres, uma vez que a crise está corroendo de maneira decisiva o poder efetivo das nossas notas de real.
Se somarmos todas essas hipóteses, o resultado é muito pouco estimulante. Todas elas, no entanto, tem uma causa comum: o pouco repertório que o brasileiro tem, a pequena bagagem trazida por uma educação de baixa qualidade e por uma média vergonhosa de 1,4 livro lido por ano (contra 8 nos EUA e 6,4 na Alemanha e na França).
Se lêssemos mais, estaríamos mais abertos a ouvir os argumentos dos outros e a racionalizar em cima deles.
Se lêssemos mais, não seríamos tão dogmáticos com relação às nossas crenças: entenderíamos que são ideias e que, até por isso, podem e devem ser questionadas, melhoradas ou derrubadas.
Se lêssemos mais, certamente votaríamos com mais consciência.
Se lêssemos mais, não cairíamos nas ciladas verborrágicas que cismam em segregar o país geográfica, social e economicamente.
Talvez a solução que esteja propondo aqui esteja vindo tarde demais – ao menos para este delicado momento da nossa história, já em curso.
Talvez ela funcione apenas para próximas crises pelas quais certamente passaremos.
Ainda assim, deixo-a como uma espécie de proposta que considero óbvia para o crescimento sustentável de qualquer povo ou nação.
Como se combate uma crise?
Com livros.
Concordo com o autor, porque hoje muita gente acha que pode opinar, principalmente nas redes sociais, mas sem ter aprofundamento em nada. É um tal de palpitar sobre qualquer coisa, de uma forma tão pouco consequente, que dá até vergonha de imaginar que as pessoas passaram por escolas. Ler, que é bom, nada!
Apenas um exemplo: citaram uma frase supostamente atribuída a Machiavelli, o autor italiano de vários livros que ajudaram a criar a ciência política no Ocidente. O pessoal alegou que alguns professores citaram, que eles ouviram falar da frase, que leram num pedaço da página tal de um jornal de que não lembram o nome, mas não sabem nem direito quem foi o autor, tampouco em que contexto se aplicaria a tal frase. A questão é que nunca Machiavelli escreveu tal frase, que a ele foi atribuída erroneamente por um problema de tradução. Li o autor no original italiano e nunca vi tal frase. A diferença é que eu li, não fiquei de carona no que outros falavam ou no que eu achei que li em um pedacinho de jornal. Isso é realmente de lamentar. E essa história de ficar repetindo o que alguém deve ter dito alguma vez é desolador. Vamos ler mais, gente! Um abraço a todos.
Parabéns pelo consistente artigo retratando o difícil momento que vivemos seja econômico ou político. Colocar a questão educacional e a falta de leitura no Brasil como uma questão central desde debate me parece bastante acertado.