O que Harry Potter pode ensinar aos escritores de hoje?

Há alguns anos, enquanto visitava a Feira do Livro de Londres, acabei agendando uma reunião na PotterMore, empresa da JK Rowling que tem como missão, em termos práticos, prolongar até o infinito a “experiência Harry Potter”.

No mundo mais cult (tendendo ao intelectualóide), os livros de Harry Potter são quase endemoniados. Mas ninguém pode negar o seu sucesso: em alguns anos, a escritora conseguiu cativar mais leitores adolescentes do que qualquer outra pessoa em toda a história da humanidade. Uma aula para todos nós, autores, que sempre estamos buscando novas formas de aprimorar os nossos textos e de divulgar os nossos trabalhos.

Tendo origem no papel escrito, Harry Potter logo chegou às telas de cinema onde arrecadou uma média de US$ 1 bilhão por filme – e nunca diminuindo as vendas dos livros. Pelo contrário: a ansiedade por novos textos da autora beirava a loucura.

Mude, agora, a maneira de encarar. Ao invés de pensar nos livros do Harry Potter, pense no modelo de narrativa.

Ao fazer isso, consegue-se somar textos, filmes e, claro, Internet. O carro chefe da Pottermore, hoje, é a sua comunidade online – a pottermore.com . O que ela faz? Permite algo diferente aos fãs do pequeno mago: interação viva.

Por interação, entenda inclusive testes online gratuitos que alocam cada usuário em uma das “casas” de Hogwarts, como Gryffindor e Slytherin. Há textos inéditos da autora, um relacionamento próximo com a comunidade e um tipo de prolongamento da saga que vai além da história de Harry Potter em si e chega a novos personagens e detalhes do universo mágico que ela criou.

Isso nos ensina duas coisas:

1) Escrever para mentes é diferente de escrever para páginas.

Ao pensar em uma história, sempre vale a pena explorar possibilidades que vão além de livros, como aplicativos, sites etc.

No caso da Pottermore, a própria criação desse ecossistema de conteúdo envolvendo site, livro, filme e interação com a autora já traz uma riqueza que apenas garante níveis muito, mas muito mais intensos de imersão na trama.

E, se pensarmos bem, não é exatamente necessário termos um sucesso estrondoso para começar a pensar em algo assim. Todo projeto de divulgação de um livro precisa ser multimídia por natureza, precisa envolver um público que está muito além das prateleiras de livraria. E qual a melhor maneira de cativar um público do que entregar a ele amostras do universo da sua narrativa em todos os lugares possíveis? Em grande parte, aliás, o nosso guia de divulgação de livros fala essencialmente desse processo.

2) Que universos não tem dono.

Esse segundo ponto é importante por ser uma espécie de falha no modelo da Pottermore. Lá, por mais que eles incentivem a interação, eles são declaradamente contra FanFics (livros de ficção escritos por fãs e tendo como base personagens e enredos originais).

Aqui vale uma observação: é natural que uma autora, por mais famosa que seja, não se sinta à vontade ao ter terceiros que ela não conhece escreverem sobre os seus “filhos”. Até aí, tudo bem.

Mas, se você se propôs a criar um universo mágico inteiro, como evitar que ele caia nas mãos de outros escritores?

Há um ditado que prega que escrever um livro é o mesmo que brincar de Deus, pois o autor tem poderes plenos de criação e destruição. O problema é que, depois de publicar o livro, esse poder é inevitavelmente compartilhado pelo mundo de leitores-escritores que mergulham na história. Cada um quererá participar com as suas próprias letras – e é esse movimento, esse envolvimento, que permitirá uma narrativa sobreviva ao seu autor original.

Não dá para afirmar, ainda, se a Pottermore mudará de ideia no futuro, mas dá para afirmar que essa relação com autores de FanFics certamente é algo delicado.

O que deve ficar de lição para autores?

Em uma frase: o foco total na criação de universos multifacetados e multimídia em que a trama se insere sem nenhuma preocupação com terceiros criarem novas histórias baseadas em sua trama. Por que?

Bom… cada FanFic criada com base em sua história será uma nova e incomparável força de divulgação para você. Por outro lado, para quer você consiga isso, é realmente fundamental criar um universo riquíssimo e, sobretudo, autêntico.

No final das contas, por mais que todo o processo de publicação e divulgação sejam fundamentais para o sucesso de qualquer livro, é a sua criação, o seu conteúdo, a sua narrativa que mais acaba fazendo a diferença. E isso não mudará jamais.

Ricardo Almeida

Sou fundador e CEO do Clube de Autores, maior plataforma de autopublicação do Brasil e que hoje responde por 27% de todos os livros anualmente publicados no país. Premiado como empreendedor mais inovador do mundo no segmento de publishing pela London Book Fair de 2014, sou também escritor, triatleta e, acima de tudo, pai de família :)

3 comentários em “O que Harry Potter pode ensinar aos escritores de hoje?

  1. All I can say is, Oh, puke! I was looking forrawd to the Encyclopedia, as I can’t really access Pottermore from my home computer, nor is it really an easy download site for the public internet terminals at my work, so getting extra back-story that way is pretty much out for me.While I think that JKR may well be somewhat burned out with regard to Harry Potter I’m sure that as a writer she’d like to move on to other things like it or not, she’s kind of stuck with her own creation. I see releasing back-story content on Pottermore only as one of two things a) a gimmick dreamed up by Sony/Pottermore to keep people coming back to Pottermore, or b) an easy way for JKR to slide out from underneath what would turn into a big demand on her available writing time. Personally, I think it is a big dollop of a and a smidge of b , and it does not make me happy at all.With regard to the new/old boxed set, this is just bog-standard let’s reboot what we’ve got because there’s nothing new to sell hype. The phrase beating a dead horse springs inexorably to mind, and frankly, I won’t be spending any money on the same old stuff in new clothes. I am first and foremost a book-lover who loves and supports good authors JKR included and all that Harry Potter ebooks and re-released box sets are, are endless retreads. If JKR wants more of my money for the Harry Potter franchise, she’s going to have to write something new/more that I can buy in a bookstore

  2. O Universo de Star Trek, Stargate, Harry Potter e Battlestar Galáctica, são universos mutáveis porque existe ampla visão angular de personagens secundários e de fatos conhecidos apenas em referências dentro de argumentos para explicar tal. O processo chamado de reimaginação possibilita analisar os aspectos presentes nestes eventos e ampliar o universo conhecido.

Deixe uma resposta para Alberto Cancelar resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *