Qual livro é mais fidedigno: Os Sertões, de Euclides da Cunha, ou Guerra do Fim do Mundo, de Vargas Llosa?
Já começo aqui pedindo desculpas se ofendo qualquer um com meu próprio gosto literário. Não nego, nem poderia negar, a poderosíssima importância histórica dos Sertões: sem ele, todo um tempo-espaço do nosso país seria desconhecido.
Mas, entre as páginas e mais páginas de dados históricos, há uma narrativa chata, insuportável, daquelas que faz o leitor questionar seriamente a sua própria sanidade caso pense em prosseguir até a última página. Os Sertões é tão linearmente verdadeiro que ele ultrapassa as fronteiras da chatice aceitável.
Mude, agora, de livro: vá para A Guerra do Fim do Mundo.
A história é a mesma: a Canudos de Antônio Conselheiro; a narrativa, por outro lado, é extremamente diferente.
Sim, há dados históricos e personagens inquestionavelmente verdadeiros. Mas há também pequenas corruptelas – como o fictício Barão de Canabrava, representando o Brasil velho e que, na vida real, provavelmente era o Barão de Jeremoabo.
Há cenas que poderiam facilmente ter existido – como diálogos entre soldados e jagunços – mas que dificilmente teriam sido exatamente aqueles, proferidos exatamente por aquelas pessoas. São alguns dos melhores diálogos de uma obra prima digna do Prêmio Nobel, acrescento.
Há realidade, sem dúvidas, algo comprovado por séries de referências históricas encontradas nos próprios Sertões de Euclides da Cunha. Mas, para aqueles momentos em que a realidade fica chata ou obscura demais, há a ficção com sua pulsação mais forte, mais densa, mais intensa.
O que, no fim, importa mais?
Uma realidade tão enfadonha quanto todas as realidades que existem, ainda que de uma densidade aterrorizante como a de Canudos do fim do século XIX, ou uma visão romanceada e, portanto, mais emocionante, dela?
A pergunta foi retórica: para mim, pelo menos, a verdade mais verdadeira, aquela que pode ser esticada em uma simples linha de tempo, é apenas um livro mal escrito.
A verdade que fica para a posteridade, afinal, é sempre a versão mais bem contada da história.