Sobre o papel

Estamos rodando, já desde meados do ano passado, algumas experiências diferentes aqui no Clube – todas muito discretas, até por serem testes efetivos de conceito que queremos entender melhor. 

Esses testes, no entanto, estão transformando algumas importantes suspeitas em certezas indiscutíveis de caminhos e barreiras comumente enfrentadas por autores de todo o mundo. Começo por descrever aqui uma delas, atualmente a principal base do mercado editorial tradicional: o papel. 

E não falo aqui de nenhuma divergência entre impresso e digital – para mim, a mera discussão sobre isso é perda desnecessária de tempo e de recursos. Falo sobre um outro aspecto: o do uso do papel de maneira quase ideológica como argumento para o tradicionalismo editorial. 

Falo sobre o modelo de tiragens, sobre a crença de que é importante imprimir grandes volumes para se estar presente em grandes livrarias para se conseguir vender.  

Falo sobre essa receita abaixo, até hoje tão preconizada como indiscutível modelo de sucesso para autores: 

  1. Imprima uma tiragem grande, de 500 a 1.000 exemplares, garantindo um custo unitário baixo
  2. Feche um contrato com uma distribuidora ou com livrarias para garantir presença
  3. Articule um evento grande de lançamento
  4. Espere as vendas acontecerem

Sabe onde está o problema aqui? No destino principal do dinheiro: o papel. 

As óbvias falhas de um modelo que muitos ainda insistem em acreditar

Claro: se você tiver centenas de milhares de reais, conseguirá montar um plano de marketing poderoso e diluir o investimento em tiragem a algo relativamente pequeno. Mas essa não é a regra, o padrão. O padrão é uma verba enxuta, contada, em que cada real investido em um algo é um real a menos em um outro algo. Trocando em miúdos, isso significa que cada real gasto em uma tiragem grande é um real a menos que se tem para investir em marketing. 

Vamos a outro ponto: a distribuição. Acredite no óbvio: hoje, a quantidade de títulos diferentes brigando pelo espaço físico de livrarias é incalculável. A competição é tamanha, mas tamanha, que qualquer tentativa de briga passa a ser quase um ato de suicídio. Quem garante, afinal, que um contrato feito entre você e uma distribuidora ou mesmo uma rede de livrarias fará com que seu livro vá para alguma vitrine? E, se não for, e ainda assim você conseguir o dificílimo feito de deixá-lo escondido em alguma prateleira, quem garante que isso resultará em venda? Não devemos confundir um livro na prateleira com um livro bem exposto. Jamais. 

Entra aí um outro ponto, mais obscuro, quase indizível: o amadorismo burocrático do mercado editorial brasileiro. 

Se você conseguir fechar um acordo com uma distribuidora, dificilmente conseguirá ter isso em contrato. Contrato é quase que um palavrão nesse curiosíssimo universo. Mas você terá que remeter algumas centenas de exemplares a ela para que ela, claro distribua. 

Quanto receberá por isso? Nada. Tudo é feito em consignação. 

Você manda 500 livros para uma distribuidora, que tenta negociar com algumas livrarias. Em alguns casos, ela conseguirá; em outros, não. Muitos desses livros permanecerão nos galpões esperando pedidos e acumulando ácaros. 

Se os pedidos não vierem, você nunca verá o real que investiu de volta. 

E se vierem? E se ocorrerem vendas? Nesse caso, somente a vontade de renovar o estoque é que fará as livrias informarem os distribuidores. Caso contrário, o argumento da consignação servirá como motivo protelatório de qualquer prestação de contas. 

Vamos, então, à matemática: no acordo com uma distribuidora, você abrirá mão de 50% ou 60% do preço de venda do livro, montante que remunerará a cadeia inteira. Será dos 40% ou 50% que sobrarão que você terá que tirar o dinheiro necessário para se reembolsar dos custos gráficos de toda a tiragem, dos investimentos em capa, revisão, diagramação e tudo mais. 

Fora isso, as prestações de conta feitas pela distribuidora, supondo que trabalhe com uma (mesmo porque as alternativas são quase inexistentes), são manuais, em forma de troca de arquivos Excel com datas imprecisas e que chegam, quase sempre, depois de súplicas do autor ou da editora. Entra em cena um novo problema: o tempo. Se a distribuidora for informada da venda de um livro em janeiro, ela receberá o dinheiro da livraria em março ou abril – e isso se a livraria não atrasar, o que aliás tem sido a norma do mercado brasileiro. O pagamento ao autor? Some mais um ou dois meses a isso. 

A matemática de um modelo falido

Resumo da ópera: 

  1. Se tudo der errado, você terá investido milhares de reais na cadeia de produção e não receberá um único centavo de volta
  2. Se tudo der certo, você precisará praticamente montar uma operação inteira para receber de volta, e em longas prestações, todos esses milhares de reais que terá investido

OK, por enquanto, estou só falando de problemas. E não estou dando uma mera opinião: nesses últimos meses nós fizemos acordos com distribuidores, rodamos algumas tiragens maiores de livros e fizemos tudo como a cartilha manda. 

Resultado prático, financeiro? Difícil.

Conclusão óbvia: não há como sustentar um modelo de negócios sem, claro, negócios. 

A alternativa perfeita

Não é por outro motivo que o mercado editorial brasileiro está implodindo, com fechamento de editoras e livrarias em todo o país. O anacrônico, no entanto, reside no fato de que o brasileiro nunca leu tanto quanto hoje. 

Vamos, então, a um raciocínio matemático: se há mercado consumidor crescente e mercado fornecedor em crise, há, por obviedade, um problema de modelo. É ele que vamos atacar agora – e que convidamos todos os autores a fazer o mesmo em 5 passos simples, conclusões que chegamos depois desses meses e que estão nos fazendo criar uma estrutura paralela aqui no Clube e que deve beneficiar a muitos autores.

1) Não invista em papel. Valorize cada real que tiver em sua carteira agindo com mais razão e menos paixão. Tem 5, 7 mil reais que planejou para uma tiragem de mil exemplares? Pegue todo esse dinheiro e invista em marketing. Sim: o custo unitário de impressão será obviamente maior do que o de uma tiragem em escala – mas, desde que a demanda exista, isso não é problema. Traduzindo em miúdos: é melhor ter um produto que custe R$ 15 e que venda a R$ 30 do que um produto que custe R$ 5, que te force a investir de maneira antecipada, e que simplesmente não venda. O que vai acontecer se você não investir seu dinheiro em marketing é justamente isso: uma venda baixa. 

2) Não acredite em milagres. Marketing, claro, não faz milagres. Um bom trabalho de mídia atrairá público, mas nao garantirá venda. Facilite o processo deixando o livro minimamente palatável, com uma capa bonita, um português revisado, uma diagramação de qualidade. 

3) Profissionalize seu marketing. Hoje, as ferramentas de marketing existentes – principalmente na Internet – são tão grandes e amplas quanto baratas. Você não precisa dominar o marketing digital – mas precisa entender que será uma ferramenta crucial para o sucesso do seu livro. Sugestão: corra atrás de uma agência, pequena que seja, para administrar a sua comunicação. Fazer tudo por conta própria, às vezes, é menos inteligente do que parece. Além disso, o montante que você economizará ao deixar de comprar uma tiragem grande para seu livro será mais que suficiente para remunerar uma campanha profissional.

4) Abra mão das crenças antigas. O sonho de muito autor é ver o seu livro exposto na vitrine da livraria preferida. Bom… Os tempos mudaram. Abra mão desse sonho. O importante para um escritor é ser lido – e isso acontecerá apenas se ele for comprado. Hoje, ser comprado significa poder ser achado – e os mais de 100 milhões de usuários de Internet no Brasil são uma base mais que suficiente. Aqui voltamos ao cerne da questão: estar em uma livraria significa investir um belo naco das suas economias em tiragem, em papel – e isso o transformará em um administrador de estoque (e não em um escritor reconhecido, famoso). Mergulhe na Internet. Se seu livro puder ser achado na rede, isso já é o suficiente – ele já será vendável. A partir daí, o seu papel passa a ser o de atrair público e converter vendas (algo que conseguirá com os itens 3 e 2, respectivamente). 

5) Administre-se. É impossível gerenciar qualquer tipo de negócio sem um controle mínimo de custos, sem saber quanto está vendendo e quando receberá por isso. O ocaso do mercado editorial tradicional está sendo ditado por isso, por esse amadorismo em cadeia, muito embora a maior parte dos editores esteja com dificuldade em enxergar o óbvio. Qualquer acordo de comercialização que não seja absolutamente transparente, que não te permita saber exatamente quanto está vendendo, não funcionará. 

Sabe qual a parte mais curiosa desses 5 pontos? É muito mais fácil trabalhar sob eles do que se imagina.

Nos próximos dias vou postando mais conteúdo sobre isso aqui, no blog, incluindo alguns números do Clube e algumas ações nas quais estamos trabalhando para facilitar a vida administrativa dos nossos autores. 

O mais importante, por hora, é que demos os nossos primeiros passos nos aventurando pelo mundo editorial tradicional – e saímos dele com a mais absoluta certeza de que o caminho para o sucesso está no lado oposto, na autopublicação, na impressão 100% sob demanda e na gestão transparente da carreira. 

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Ricardo Almeida

Sou fundador e CEO do Clube de Autores, maior plataforma de autopublicação do Brasil e que hoje responde por 27% de todos os livros anualmente publicados no país. Premiado como empreendedor mais inovador do mundo no segmento de publishing pela London Book Fair de 2014, sou também escritor, triatleta e, acima de tudo, pai de família :)

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